sexta-feira, 4 de junho de 2010

Doce Submissão (Continuação 10)





Acordei sentindo alguns tapinhas leves no rosto.
- Acorde, menina dorminhoca!
- Mas... mas... como? – foi a única coisa que consegui sussurrar.
- Não fique aí com essa cara de quem viu um morto vivo! – falou Carlos soltando a sua risada mais sarcástica do mundo. – Adivinha... eu estou vivíssimo! E outra coisa, agora quero mesmo você para mim! Sem ninguém se metendo no meio!
Bastaram essas palavras para que eu desmaiasse novamente. Carlos era realmente imprevisível. De certo haveria forjado a morte para se livrar de algumas investigações e das acusações que pesavam sobre ele. - Como ele era maquiavélico! – pensava eu. Se ele foi capaz de mais esta proeza, então não duvidaria de mais nada que viesse dele.
Novamente alguns tapinhas leves no rosto e eu desperto já tendo certa noção do que estava acontecendo. Carlos desta vez não estava para brincadeiras. Já havia perdido tudo o que resta de um homem, que era a sua dignidade, nada mais faria sentido para ele. Nada mais o seguraria.
- O que pretende desta vez, Carlos? Me trancafiar novamente num quarto e me deixar viver à mínguas, mesmo tendo a certeza de que nunca vou te amar, e que, agora não tenho desejo algum por você? É isso?


- Não quero seus sentimentos, Letícia! Não vim em busca de perdões ou outras coisas. Nunca teremos uma vida normal depois de tudo o que passamos e disto eu estou ciente!
- Então o quê quer aqui?
- Já disse, vim te levar comigo! E sim, viverá para satisfazer minhas necessidades, principalmente a necessidade que tenho de você, do seu corpo, da sua voz, dos seus gemidos! Será só minha! – Carlos parecia um verdadeiro louco falando essas coisas. Desta vez estava completamente fora de si.
- Eu prefiro que me mate! – falei eu , me levantando do chão e tentando correr em direção à porta da varanda. Corri e vi Carlos correndo atrás de mim. Acabei tropeçando no tapete e caindo entre a sala e a varanda. Carlos veio logo atrás e se jogou em cima de mim, me segurando com o corpo. Depois se levantou e me puxou para perto dele.
- Desta vez não perderemos tempo com malas nem outras coisas. Vamos agora! – ele falava parecendo ter algo dentro dele que eu desconhecia. De forma brusca, Carlos foi me puxando para fora da casa. Chegando na varanda, passamos perto de uma mesinha de canto que ficava ao lado de umas cadeiras de palha. Quando vi o vaso de rosas não pude pensar duas vezes, o agarrei com toda a minha força e o arremessei sobre a cabeça de Carlos que ficou tonto na mesma hora, mas não chegou a desmaiar. Eu aproveitei a deixa e saí correndo novamente. Estávamos no quintal e logo me pus em direção ao portão da frente da casa. Talvez eu demorasse muito para encontrar alguma ajuda, já que nossa casa era num condomínio de lotes muito separados uns dos outros. Mas quando corri para o caminho de pedras que me levavam ao portão central, vi de longe o carro de Bruno chegando. Senti um alívio que, se não era o nirvana, chegava bem perto. Corri para a pista de forma que Bruno pudesse me ver de onde estava e comecei a acenar. Bruno logo percebeu a estranha movimentação e acelerou o carro. Olhei para o lado de dentro da casa e percebi que Carlos me procurava. Aproveitando do fato de ele não ter visto que eu já estava lá fora, me enfiei entre a cerca viva e tentei fazer o mínimo barulho possível até que Bruno chegasse. Carlos correu para fora logo na hora em que Bruno estava chegando mais perto. No susto de ver o carro se aproximando dele, Carlos se jogou no chão. Bruno quando viu Carlos, ao invés de frear o carro acabou acelerando mais ainda e só parou a milímetros de Carlos. Desceu do carro visivelmente transtornado. Eu logo corri para perto de Bruno, que começou a praguejar contra Carlos.
- Mas que maldição! De onde você saiu? Pensei que tivesse nos deixado em paz! O que faz aqui agora? O que quer aqui?
Carlos não dizia uma só palavra. Levantou-se calmamente, limpou toda a sujeira de sua roupa e num olhar cínico começou a sorrir. Olhei para Bruno e comecei a contar tudo o que Carlos havia me contado, sobre a história de forjar sua própria morte e sobre querer me levar de vez dali. Bruno virou-se furioso para Carlos.
- Se você não morreu, eu agora me encarrego disso! – falava Bruno enquanto caminhava em direção a Carlos.

- Não, meu amor! Não percebe que é isso que ele quer?! Você pode ser preso por conta disso. Vamos chamar a polícia, será a coisa mais sensata a se fazer neste momento!
- Não, Letícia! Não farei isso! Se você está com pena dele é melhor se virar porque esse safado não vai sair daqui vivo! – Bruno voltou do carro com a única coisa que ele encontrou que pudesse ser útil naquele momento. Uma tranca de volante. Carlos permanecia imóvel e ainda com aquele sorrisinho cínico no rosto.
- Bruno, por favor, pense um pouco. Já temos um maluco aqui e ele se chama Carlos, não caia no jogo dele, meu amor! Me escuta, por favor! – falei tentando usar qualquer artifício que convencesse Bruno a se afastar de Carlos, mas Bruno estava possesso e minhas manifestações só serviram para enfurecê-lo mais ainda. Me segurando pelo braço, começou a questionar meus motivos para defender Carlos.
- O que você deseja afinal, Lê? Porque está defendendo tanto esse babaca aí? Por um acaso você ainda sente algo por ele? Vamos, responda, Lê! Estou esperando! – Bruno parou por um momento para ouvir o que eu teria a dizer, como permaneci calada Carlos se aproveitou para intervir e atiçar mais ainda as dúvidas de Bruno.
- Isso, vai amor! Diz para ele o quanto ainda estou presente nos seus pensamentos! Conta para ele os momentos perfeitos que tivemos naquele apartamento que mais poderia ser chamado de nosso ninho de amor! – Carlos falava numa convicção tão grande que faria o mais incrédulo dos homens acreditar em tamanhas mentiras.
- Isso é mentira! – eu gritei. Bruno espantou-se com meu tom de voz.
- Oras, Lê! Nem você acredita que isso seja uma mentira! – Bruno falou com a voz mais dura que poderia lançar.
- Admita e venha comigo, Lê! – Carlos falava sorridente e cínico como um verdadeiro maluco.
- Nunca! Parem vocês dois! Estão me atormentando com esta conversa sem futuro! – Eu falei já com lágrimas nos olhos. Não estava agüentando aquela pressão toda. E o que estava acontecendo com Bruno? Porque estava entrando no jogo de Carlos? Se eu havia lutado tanto, se passamos por tantas coisas para conseguirmos ficar juntos, como ele poderia estar duvidando só agora de meu amor por ele? Eu só tinha certeza de uma coisa, não ficaria ali para ouvi-los.
Corri até o carro, as lágrimas inundavam minha face. Eles se arrependeriam de tudo o que estavam fazendo, era o que eu pensava e desejava sutilmente acreditar naquilo. Observei por mais alguns segundos, quando percebi que eles estavam se aproximando. Liguei o carro e saí em disparada, eles observaram atônitos. Não fiz questão de olhar para trás, tudo o que eu queria era sair dali.
Algumas horas de viagem e eu estava novamente naquele paraíso inebriante, longe de tudo e de todas. Júlia logo veio me receber. Assustou-se quando viu meu estado. Meus olhos certamente me denunciavam. Desde a hora em que saí de perto daqueles dois até a hora em que cheguei naquele lugar reconfortante não contive uma lágrima sequer. De certa forma, ver Júlia e retornar àquela casa onde passei tantos momentos bons com Bruno, fez com que eu tivesse um tanto mínimo de paz no coração.
- O que houve, Letícia? Por favor, me diga o que aconteceu com você? E onde está Bruno? – perguntou Júlia completamente atemorizada.
Algum tempo depois consegui deixar Júlia a par de toda a situação.
- Céus! Mas então, este Carlos é um manipulador psicopata, uma pessoa muito perigosa! – exclamou ela.
- O pior foi Bruno ter subitamente passado para o lado de Carlos assim, desta forma! – falei ainda perplexa com as atitudes de Bruno.
- Mas se é como me dizes, não poderá ficar aqui por muito tempo! Bruno logo virá procurá-la.
- Eu sei disso, mas eu precisava me acalmar um pouco, por isso eu vim. – falei ainda pensando que tal ato poderia me trazer conseqüências mais tarde.
- No que eu puder ajudar, pode contar comigo! – Júlia falou enquanto se levantava do sofá – Vá tomar uma ducha, descanse um pouco, vou preparar algo, pois sei que deve estar sem comer até agora e corpo vazio não para em pé. Se não puder ficar aqui por muito tempo, pelo menos descanse o tempo necessário para que possa prosseguir. – Júlia se retirou e me deixou na sala com meus pensamentos.
Por alguns minutos andei vagarosamente reparando aquela sala de estar. Um cantinho especial onde eu e Bruno fomos tão felizes um dia. Aquele lugar me incomodava um pouco, eram lembranças de sentimentos que em breve não existiriam mais, ou se transformariam em lembranças massacrantes. Subi para meu quarto. – Nosso quarto! – falei em voz baixa vendo os pensamentos voltarem a me confrontar com todas aquelas lembranças. Como ele poderia ter sido tão egoísta a ponto de deixar que todo aquele amor se resumisse a nada? Deixou que fosse destruído como castelos de areia quando são levados pela maré. Aquilo tudo me parecia tão injusto!
Não demorei muito no banho, deitei quase na beirada da cama. Fiquei ali tão quietinha que adormeci sem perceber. Talvez pelo cansaço ou talvez porque as lembranças eram tão aconchegantes que eu havia me deixado conduzir por aquele sossego distante.
Acordei e a primeira coisa que senti foi seu cheiro. Aquele perfume inebriante que se espalhava por todo o quarto. Uma beleza estonteante, um ar imperial e aquela respiração inconfundível quando ofegante fez com que meu peito se enchesse de temor que misturado a raiva fez meus olhos se abrirem perplexos. Todos aqueles sentidos abstratos tomavam agora a forma daquele homem que eu tanto amava. Sentado numa cadeira ao lado da cama, vi Bruno me observando.

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