sexta-feira, 9 de dezembro de 2011

Uma Música Brutal - Nono Capítulo (Parte 2)

Ter chegado à metade da aula não foi tão proveitoso assim, ainda mais numa aula tão complexa quanto aquela estava sendo. Carlos ainda inventou de me ligar no meio da aula para saber de mim e saber porque eu não havia acordado nem ele nem Samantha para me trazerem a aula, expliquei que estava tudo bem. Ele não acreditou, então disse que passaria mais tarde para me ver. Ele sem querer acabou me desconectando mais ainda com a aula. Decidi ir para a sala de estudos e pegar a matéria depois, junto com o pessoal do grupo de estudos.
                                              
Como não havia muita gente na sala de estudos individual eu logo consegui um lugar para me sentar. O lugar todo era separado por várias “baias” que abrigavam os estudantes, fazendo uma espécie de “mini sala” para cada um. Isso permitia uma maior privacidade. Estava concentrada nos livros, mas a todo o momento eu percorria a sala contemplando de alguma forma o estranho silêncio que reinava naquele local. Novamente me reconfortava pregando os olhos nos estudos. De repente ouvi a porta abrir lenta, devagar, e alguém adentrar a sala de estudos. Desviei o olhar para a estagiária que controlava a entrada e a saída dos estudantes, ela parecia normal. Voltei os olhos ao estudo. Uma risadinha sufocada ecoou no recinto e eu novamente desviei o olhar, observando-a. Agora ela conversava com um rapaz alto, que se debruçava sobre o balcão onde ela ficava. “Os dois parecem íntimos, uh!” – eu pensei erguendo a sobrancelha. Concentrei-me novamente nos estudos.


O sinal de saída tocou chamando a minha atenção. Eu estive tão atenta aos livros que nem percebi que a sala de estudos já estava vazia. Olhei para o balcão como se procurasse um ponto de referência. A estagiária ainda estava lá, concentrada em seu notebook. Levantei-me para arrumar minhas coisas e observei que havia mais um viciado em estudos sentado na terceira baia depois da minha. “Como eu não o vi passar por mim?” – eu pensei achando graça da minha desmedida distração. Disfarcei e olhei mais atenta para ver se conhecia o sujeito – como eu ficava muito tempo na faculdade passei a conhecer mais pessoas que também faziam o mesmo que eu; ficavam lá o tempo todo. Recordei a tempo de não cair da cadeira na qual eu me encostei para ver o homem, era o cara que esteve conversando com a estagiária há pouco tempo atrás. “Pouco tempo?” - eu pensei olhando no relógio – “Já se passaram três horas! Que distraída!”.

Sentei novamente na cadeira para desconectar o fio do celular que eu havia deixado carregando. Um vulto passou por mim, e eu, mesmo sem ter achado o fio do celular, levantei a cabeça curiosa. Aquele perfume me fez recordar alguém que eu não via há muito tempo, e eu tentava lembrar quem. Fiquei o observando quando ele alcançou novamente o balcão. Desta vez prestei mais atenção. Os detalhes de seu corpo, seus braços, a camisa colada em seu corpo. Seu rosto de perfil o denunciou. A incrível semelhança teria me deixado confundir caso não fosse o perfume que ele exalava. Não, não era Dérick. Era Victor!

A estagiária começou a sorrir novamente de algumas coisas que ele falava ao ouvido dela. Não se incomodou comigo ali, talvez nem soubesse que eu ainda estava ali, mas ele sabia. Se sabia! Eu fiquei paralisada em minha cadeira. Arranquei de uma vez o fio do carregador do celular, quase o quebrei. Minhas mãos tremiam, minhas pernas pareciam nunca terem conhecido o chão e eu me sentia tão zonza quanto quem acabara de sair de uma navegação turbulenta. Eu sabia que não podia me desesperar, sabia que ele estava ali por um motivo. Meu objetivo principal era não deixar esse motivo se cumprir. Eu deslizei sorrateiramente pelas baias tentando não fazer chiado algum. Fiz a volta nas baias para não passar em frente ao balcão da atendente, mas quando cheguei próximo a porta e virei para vê-los percebi que ela estava sozinha agora e olhava para seu notebook como se nunca tivesse conversado com ninguém. Céus! Eu estava tendo alucinações? O que estava acontecendo afinal? Mesmo atordoada não quis perder tempo pensando, apenas abri a porta e comecei a seguir a multidão até a saída da faculdade.

Cheguei na porta, mas lembrei do carro. “Na garagem. Droga!”. Para a minha sorte acabei esbarrando em alguns amigos e amigas da minha turma e então pedi a eles que me acompanhassem até a garagem. Eu tremia tanto que eles acharam que eu deveria ir para o hospital, pois tamanha era a palidez em meu rosto. Eu disse que não era preciso e que eu só queria estar em casa naquele momento. Todos concordaram. Quando sai com o carro da garagem fiquei olhando em volta para ver se via algo. De repente o vulto daquele homem passou dobrando a esquina, caminhando lentamente. Eu o segui para ter certeza de que não estava delirando ou ficando maluca. Eu tinha que saber se era ele.

Fiz a curva de forma descuidada. Quase atropelei um rapaz que atravessava a pista. Algumas pessoas condenaram minha atitude e acabaram fazendo algum estardalhaço. Eu não parei o carro, mas o minuto que passei por ele foi tempo o suficiente para vê-lo virando-se em minha direção e lançando um daqueles sorrisos cheios de malícia e crueldade. Era ele sim. Era Victor. E se ele foi até a escola para me confrontar, isso significava dizer que ele ainda estava atrás de mim, só sumiu para ganhar tempo. Corri para o prédio. Estacionei, entrei no apartamento e me tranquei encolhendo-me no sofá como uma criança assustada. Logo liguei para Carlos e Dérick e em poucos minutos eles estavam no apartamento.

- Seu irmão é um louco! – Carlos bufou.

- Eu não culpo você por pensar assim! – Dérick falou, consentindo. – Ele tentou te machucar, bebê? – ele falou me afagando em seus braços.

- Não, ele não fez nada. Mas foi estranho, como se ele estivesse esperando por um momento mais apropriado, eu não sei. Ele ficou sozinho comigo naquela sala de estudos e eu nem sabia que ele estava lá. Ele não vai me deixar em paz, eu sei disso! – eu falei colocando as mãos no rosto, sentindo lágrimas caírem. O inferno não havia acabado, afinal.

- Ele deve estar controlando seus passos. Teremos que mudar sua rotina! – Dérick concluiu.

- Isso não soa muito justo, hã?! – Carlos analisou. – Deve haver outra forma. Temos que comunicar à polícia!

- Faremos isso. Mas temos que nos certificar de que ela estará bem enquanto eles não colocam as mãos em Victor! – Dérick considerou. Eu ainda tremia e tentava controlar o ar que entrava em meus pulmões. Era o suficiente para ter o olhar protetor de Dérick todo voltado a mim, seu grande problema da vez. – Acalme-se bebê. Estou com você agora! – ele murmurou me abraçando como se eu fosse seu bichinho de estimação.

- Isso deve ser horrível. Ter a liberdade tomada desta forma por causa de uma pessoa maluca que ninguém coloca na cadeia é no mínimo ofensivo! – Samantha falou demonstrando que não era totalmente uma mulher fútil. – Cuidaremos dela, não é Carlos?! – ela falou virando-se e abraçando Carlos amorosamente. Espremi os olhos tentando achar alguma falsidade naquele abraço, mas ela parecia estar sendo verdadeira. Enfim, talvez eu devesse julgá-la menos, apesar de seu jeito sempre me fazer pensar diferente. A noite terminou com todos me consolando. E o dia começou com todos nós voltando a “minha” rotina. Como se eu tivesse babás por todos os lados, eles se revezavam para não me deixar sozinha em momento algum. Até Samantha entrou neste hall.


Samantha passou a freqüentar o apartamento de Carlos e eu já havia quase me acostumado à presença dela durante as noites. Nunca vi Carlos tão preso a uma mulher assim como estava vendo agora, mas isso serviu apenas para eu arrumar uma preocupação a mais: Carlos! Todos sabiam que Samantha não era bem a namorada correta por quem um cara se apaixonaria. Seu jeito espevitado e assanhado de ser a impedia de ter um comportamento pelo menos aparentemente normal na frente dos outros e isso lhe rendia alguns apelidos um tanto constrangedores. Eu estava lidando com aquilo perfeitamente, mas não sabia até onde Carlos aceitaria esse jeito dela. Para a minha surpresa, um dia chegando em casa com Dérick, fui surpreendida por Carlos, Samantha e mais duas garotas. Jamais esperava e, pelo jeito, eu havia me enganado em ter me preocupado com Carlos, ele e Samantha haviam sido feitos um para o outro!

- Huhum! Você me trouxe para um swing? – Dérick perguntou de forma debochada.

- Oras, seu... – eu ia insultá-lo, mas ele pressionou meu braço dizendo:

- Ia me insultar, sua malcriada? – ele perguntou sorrindo. – Deveria ter deixado! Iria me pagar bem caro depois! – ele sussurrou. Eu me derreti, adorava sentir aquela pressãozinha psicológica que servia apenas para aguçar minhas fantasias ao lado dele.

- Ops! – eu fiz, sorrindo maliciosamente. Depois me voltei para Carlos, que estava sentado no sofá maior rodeado pelas três mulheres que estavam sentadas próximas a ele, na medida do possível. – Hey, Carlos! – falei chamando a atenção dele e das mulheres em volta. Ele sorriu descaradamente, não se importou com nossa presença, apenas lançou um “oi” para mim e para Dérick. As mulheres o acompanharam no cumprimento. Samantha, a mais espevitada, levantou-se em direção a nós dois e veio nos cumprimentar de perto, com direito a beijinhos no rosto. Foi ela quem falou ao meu ouvido:

- Estamos indo a uma festa de swingers! – ela falou de forma festiva, batendo as palmas das mãos e dando pulinhos em comemoração. – Vocês querem se juntar ao nosso grupo??? – ela perguntou por fim. Depois que ela captou a expressão surpresa em meu rosto, ela voltou atrás. – Bem, não custa perguntar, não é?! – ela beijou meu rosto e saiu sorrindo, saltitante como uma adolescente rebelde e sem freios. Carlos, percebendo que a namorada havia metido a “língua nos dentes” veio com um sorriso constrangido no rosto.

- Então estão indo a uma festa de swingers? – eu perguntei sarcasticamente.

- Ah, qual é “santinha”?! – ele deixou o constrangimento de lado. – Acabei de ter uma tarde maravilhosa ao lado dessas três lindas mulheres! – Carlos apontou para as três. – Minha noite promete muito mais diversão! Não finja estar surpresa com isso, você me conhece perfeitamente, nunca fui um monogâmico! As pessoas não mudam, Lê!

- Por amor mudam! – eu protestei.

- Mas os instintos sempre as trazem de volta ao que eram antes! – Dérick entrou na conversa. Eu o encarei tentando compreender a frase e o sentido dela em nossa vida. Ele não havia falado aquilo para Carlos, eu tinha certeza.

- É isso, Dérick! – Carlos concordou dando tapinhas no ombro de Dérick. – Eu só achei a minha alma gêmea! Não preciso mudar por causa dela, afinal, ela é completamente parte de mim e do que sou!

- É, Samantha também é uma safada! – eu ironizei.

- Sim, ela é! É a minha safada! – Carlos finalizou sorrindo para mim e dando um afago leve em minha bochecha. – Vamos deixar vocês sozinhos, estamos na nossa hora! – Ele falou, então os quatro saíram deixando-nos a sós naquele imenso apartamento.

Sempre ficávamos sozinhos juntos, mas era sempre uma nova sensação a cada dia. Aquele clima de reaproximação era o suficiente para reacender as lembranças que eu tinha do nosso fim de semana juntos naquele clube BDSM, apesar de não termos conversado sobre isso. Ops! O frio na barriga gelou até minha alma. Eu ainda não estava preparada para discutir qualquer coisa sobre o nosso incrível envolvimento SM, apesar de saber que a ligação entre nós dois era cada vez mais forte.

- Então, Senhor Dérick! – eu tinha um tom irônico na voz. – O que quis dizer com “os instintos sempre trazem as pessoas de volta ao que eram antes”??? – eu quis saber. Dérick pegou em meus braços, puxando-me levemente para perto dele, eu seguia como se não comandasse minhas próprias pernas. Meu corpo colou no dele e eu senti sua quentura invadir meus pensamentos.

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